domingo, 9 de abril de 2017

Vitória do correísmo não fará Equador escapar da regressiva dinâmica continental

Em mais uma eleição de­ci­dida por es­treia margem de votos, o Equador acabou de ver Lenin Vol­taire Mo­reno eleger-se su­cessor de Ra­fael Correa na pre­si­dência, a des­peito das con­tes­ta­ções dos der­ro­tados. Para co­mentar o pro­vável fu­turo do país, con­ver­samos com o ci­en­tista po­lí­tico e jor­na­lista Décio Ma­chado, an­tigo as­sessor do go­verno ca­pi­ta­neado pela Ali­ança País e crí­tico con­tumaz das in­fle­xões da cha­mada Re­vo­lução Ci­dadã.

“A es­treita margem de vi­tória tem per­mi­tido a di­reita po­lí­tica ar­ti­cular uma série de ma­ni­fes­ta­ções na rua, a fim de de­nun­ciar fraude nas vo­ta­ções, em­bora ainda não apre­sentem ne­nhuma evi­dência. Mas a ver­dade é que o pe­ríodo de Correa foi de es­ta­bi­li­dade po­lí­tica. Para ser breve, foram dois mo­mentos di­fe­rentes. De­pois de 2013, veio o se­gundo mo­mento, re­ces­sivo”, ex­plicou.

No en­tanto, Décio foge das re­centes po­la­ri­za­ções que os países sul-ame­ri­canos têm vi­vido, numa opo­sição entre es­querda e di­reita mais pro­pa­gan­dís­tica do que real. Ele ex­plica que também no Equador vem pela frente uma ro­dada de po­lí­ticas aus­te­ri­tá­rias, que na prá­tica já têm ocor­rido há pelo menos três anos, no mesmo passo, por­tanto, das curvas des­cen­dentes dos cha­mados “go­vernos pro­gres­sistas” que do­mi­naram o início de sé­culo na re­gião.

“Agora, o go­verno tenta pri­va­tizar as mesmas em­presas que tinha sal­vado da pri­va­ti­zação em seu pri­meiro mo­mento. As mesmas em­presas que ele re­cu­perou e for­ta­leceu - de ser­viços pú­blicos, a linha aérea na­ci­onal, me­ga­pro­jetos hi­dráu­licos - agora estão à venda no mer­cado, pois não há di­nheiro de­pois da queda do preço das ma­té­rias primas no mer­cado global. E há vá­rias ou­tras coisas por vir, como fle­xi­bi­li­zação das leis do tra­balho, que não ocor­reram nos anos an­te­ri­ores. Pois o fim de ciclo também se vê no Equador, na ver­dade é vi­sível nos úl­timos três anos, para além de qual­quer re­sul­tado elei­toral”, afirmou.

A en­tre­vista com­pleta com Décio Ma­chado, gra­vada em par­ceria com a we­brádio Cen­tral3, pode ser lida a se­guir.


Cor­reio da Ci­da­dania: O que você co­menta do con­texto geral das elei­ções do Equador, que ter­mi­naram com a vi­tória do can­di­dato go­ver­nista, Lenin Mo­reno, da Ali­ança País? O que o novo pre­si­dente terá pela frente?

Decio Ma­chado: A coisa foi quente, porque foram as pri­meiras elei­ções pre­si­den­ciais, em 10 anos e meio, sem a pre­sença do eco­no­mista Ra­fael Correa na cé­dula de vo­tação. Isso já foi uma tran­sição. Com a vi­tória da Ali­ança País, também temos a ne­ces­si­dade de uma nova tran­sição, pois há muita gente jovem que nunca viu outra coisa no país, senão um es­tilo agres­sivo e ati­tude um tanto au­to­ri­tária do pre­si­dente Ra­fael Correa. Mas esse mo­delo não é mais pos­sível.

A le­gis­lação exigia, para que Mo­reno ven­cesse no pri­meiro turno, 50% + 1 dos votos ou 40% de votos com pelo menos 10% acima do se­gundo co­lo­cado. Não con­se­guiu por apenas al­guns dé­cimos e teve de en­frentar o se­gundo turno.

Cor­reio da Ci­da­dania: Para além do cor­reísmo, ti­vemos a volta de uma opo­sição ne­o­li­beral, de um lado, e ou­tros mo­vi­mentos so­ciais e po­pu­lares, em es­pe­cial in­dí­genas, pela es­querda, tendo parte deles in­clu­sive mos­trado apoio ao can­di­dato der­ro­tado no se­gundo turno. Como foi isso e qual é o perfil geral da opo­sição?

Decio Ma­chado: Eram oito can­di­da­turas à pre­si­dência, sendo quatro de fato im­por­tantes. Lenin Mo­reno foi o pri­meiro vice-pre­si­dente de Correa, de­pois teve cargo na ONU e agora é o pre­si­dente eleito.

Na opo­sição, o mais im­por­tante ad­ver­sário foi Guil­lermo Lasso, que chegou ao se­gundo turno e é dono do se­gundo maior banco pri­vado do país, o Banco de Guaya­quil, e que tentou a pre­si­dência pela se­gunda vez. É um con­ser­vador vin­cu­lado à Opus Dei, grupos ne­o­li­be­rais e do con­ser­va­do­rismo eu­ropeu, li­gado também a Jose Maria Aznar, ex-pri­meiro mi­nistro es­pa­nhol pelo di­rei­tista PP à época da guerra do Iraque, a fa­mília Bush e ou­tros per­so­na­gens deste mag­ni­tude.

Mas a di­reita não foi capaz de pac­tuar uma única can­di­da­tura, de modo que se di­vi­diram em in­te­resses pes­soais. No caso, a outra ver­tente era o Par­tido So­cial Cristão, com a única mu­lher can­di­data, uma di­reita mais his­tó­rica do país, mais vin­cu­lada aos em­pre­sá­rios da costa equa­to­riana no Pa­cí­fico.

O outro grupo de re­levo era a Ali­ança Na­ci­onal pela Mu­dança, que aglu­ti­nava vá­rias forças po­lí­ticas, sin­di­catos, pe­quenos par­tidos, mo­vi­mentos so­ciais e que co­meçou o pro­cesso da Re­vo­lução Ci­dadã ao lado de Correa. Acre­di­tavam nesse pro­cesso po­lí­tico, mas com a pas­sagem do tempo e a di­rei­ti­zação do cor­reísmo foram rom­pendo em di­versos mo­mentos. Não houve um mo­mento es­pe­cial, e sim uma saída a conta gotas rumo à opo­sição. Foi o grupo de ca­ráter pro­gres­sista que também es­teve re­pre­sen­tado na eleição. Esses foram, pela ordem de força mos­trada nas urnas, os prin­ci­pais grupos de opo­sição no pri­meiro turno.

Após o se­gundo turno, os re­sul­tados do do­mingo deram a vi­tória a Lenin Mo­reno com apenas 229 mil votos a mais de que os de Guil­lermo Lasso. A es­treita margem de vi­tória tem per­mi­tido a di­reita po­lí­tica ar­ti­cular uma série de ma­ni­fes­ta­ções na rua, a fim de de­nun­ciar fraude nas vo­ta­ções, em­bora ainda não apre­sentem ne­nhuma evi­dência. No mo­mento, es­tamos en­vol­vidos neste con­flito, que está po­la­ri­zando for­te­mente o país.

Cor­reio da Ci­da­dania: Como você ana­lisa os anos da cha­mada Re­vo­lução Ci­dadã, de­no­mi­nação pela qual Correa apre­senta seu pe­ríodo, con­si­de­rando as fortes tur­bu­lên­cias vi­vidas pelo país nos anos 90?

Decio Ma­chado: De 1997 até a pre­si­dência de Correa, o Equador viveu uma dé­cada de ins­ta­bi­li­dade. Ne­nhum dos três pre­si­dentes an­te­ri­ores tinha ter­mi­nado seus man­datos. Os eleitos eram der­ro­tados por mo­bi­li­za­ções po­pu­lares, en­ca­be­çadas prin­ci­pal­mente pelo mo­vi­mento in­dí­gena, mas nos úl­timos tempos também pela ci­da­dania ur­bana.

Foi um tempo de muita ins­ta­bi­li­dade po­lí­tica, até o dia 15 de ja­neiro de 2007, quando Correa tomou sua pri­meira posse pre­si­den­cial. O país en­trou, então, em fase de es­ta­bi­li­dade, para bem e mal. Isso porque or­ga­ni­za­ções po­pu­lares e mo­vi­mentos so­ciais que co­man­daram pro­cessos im­por­tantes de mo­bi­li­zação per­deram pro­ta­go­nismo em re­lação ao Es­tado, in­clu­sive porque em muitos casos fi­caram de­pen­dentes. Assim, muitas or­ga­ni­za­ções se di­vi­diram, já que parte de seus di­ri­gentes foi cap­tu­rada pelo apa­rato de Es­tado. Por isso digo para bem e para mal.

Mas a ver­dade é que o pe­ríodo de Correa foi de es­ta­bi­li­dade po­lí­tica. Para ser breve, foram dois mo­mentos di­fe­rentes: um de bo­nança econô­mica, em es­pe­cial por conta da ex­por­tação de óleo cru, pe­tróleo, que en­quanto tinha bons preços no mer­cado global de ma­té­rias primas gerou as mai­ores rendas da his­tória da re­pú­blica. Assim, foram con­du­zidas po­lí­ticas de im­pacto so­cial sobre os mais po­bres e es­que­cidos da so­ci­e­dade equa­to­riana.

A partir de 2013, veio o se­gundo mo­mento, os preços de­caíram e co­me­çaram os pro­blemas da eco­nomia na­ci­onal. Agora o país vive uma re­cessão pa­re­cida com a do Brasil, e de­pois do pro­cesso elei­toral, um pe­ríodo de forte po­la­ri­zação so­cial as­sus­tador e cada vez mais se­me­lhante ao que acon­tece na Ve­ne­zuela.

Cor­reio da Ci­da­dania: Até por não fazer fron­teira com o Brasil, o país passa um tanto des­per­ce­bido do no­ti­ciário. Mas em en­tre­vista an­te­rior, fa­lamos do pro­cesso de re­dução da dí­vida pú­blica do Equador, o que foi ci­tado como exemplo a ou­tros países, a exemplo da­queles que de­fendem a au­di­toria da dí­vida bra­si­leira. Como foi essa ex­pe­ri­ência, uma das car­tadas do cor­reísmo em sua pro­jeção con­ti­nental?

Decio Ma­chado: Foi uma ex­pe­ri­ência muito in­te­res­sante. Em 2009, foi mon­tada uma co­missão in­de­pen­dente, autô­noma do go­verno, para es­tudar toda a ló­gica que ge­rara a dí­vida com as ins­ti­tui­ções de Bretton Woods – FMI e Banco Mun­dial.

A au­di­toria foi um acon­te­ci­mento que se deu apenas dois anos de­pois de sua in­ves­ti­dura como pre­si­dente. Foi um ca­pí­tulo muito in­te­res­sante da pri­meira fase do cor­reísmo, com as­pectos ide­o­ló­gicos muito avan­çados, pro­cesso que de­pois iria, in­fe­liz­mente, girar no sen­tido oposto.

O re­sul­tado dos tra­ba­lhos da co­missão afirmou que a dí­vida era ilegal e ile­gí­tima. Apesar de o pre­si­dente não atender a todo o con­junto da aná­lise, fez uma mo­ra­tória e qua­li­ficou parte da dí­vida ex­terna como ile­gí­tima. Não in­tei­ra­mente, mas uma par­cela muito grande.

Assim, foi de­cla­rado o de­fault, não econô­mico, mas po­lí­tico, pois não se tra­tava de falta de con­di­ções de pagar. Em dois meses, os cre­dores, as­so­ci­ados ao sis­tema es­pe­cu­la­tivo de compra de tí­tulos da dí­vida acei­taram re­ne­go­ciar os va­lores com o go­verno, que re­com­prou tais tí­tulos, por muito menos que seus va­lores an­te­ri­ores. Uma baixa de cerca de 35%. Uma jo­gada de en­ge­nharia fi­nan­ceira ba­seada no cri­tério po­lí­tico de de­finir a dí­vida como ile­gí­tima, imoral e ilegal.

In­fe­liz­mente, e de­pois da queda dos preços do pe­tróleo no mer­cado in­ter­na­ci­onal, o país voltou no­va­mente a um pro­cesso de dí­vida agres­sivo.

Cor­reio da Ci­da­dania: Por­tanto, foi esse o grande se­gredo para o in­cre­mento re­al­mente con­si­de­rável, para além do bom mo­mento que todo o con­ti­nente viveu no co­mércio in­ter­na­ci­onal, das po­lí­ticas pú­blicas e so­ciais no país?

Decio Ma­chado: Claro. Por um lado, teve a bo­nança econô­mica de toda a re­gião. Mas essa questão da dí­vida sig­ni­ficou uma eco­nomia enor­me­mente im­por­tante para o go­verno, algo neste mo­mento pró­xima aos 4 bi­lhões de dó­lares – o que no Equador é uma cifra muito alta, pois é um dos me­nores países da Amé­rica do Sul.

Em 2016, a co­mu­ni­dade in­ter­na­ci­onal foi sur­pre­en­dida em pelo menos três con­sultas po­pu­lares: o Brexit, a eleição de Trump nos EUA e o re­fe­rendo pelos Acordos de Paz na Colômbia. Em todos os casos, os re­sul­tados con­tra­ri­aram os prog­nós­ticos. Como as redes so­ciais pau­taram a eleição no Equador, le­vando em conta que Correa é um dos chefes de es­tado mais ativos na in­ternet?

Correa gosta muito das redes so­ciais. Apesar de não ser can­di­dato, ele não con­segue ficar quieto. Existem ane­dotas, casos cu­ri­osos, como Lenin dar en­tre­vista na te­le­visão e ao mesmo tempo Correa co­mentá-la nas redes, como se fosse di­re­ta­mente com ele. Também tem a ver com esses pro­cessos em que os lí­deres têm um ca­risma e um poder acima do normal.

Desde a volta da de­mo­cracia ao país, em 1979, em ne­nhuma eleição havia por­cen­tagem de in­de­cisos era tão grande, o que deixou in­certa até o final a vi­tória de Lenin. Acabou que as pes­soas pre­fe­riram manter a con­ti­nui­dade do pro­cesso de Correa, ainda que por pouca margem. A di­reita tentou o voto útil e quase mudou as pers­pec­tivas elei­to­rais. Não foi dessa vez, mas os se­tores con­ser­va­dores não querem aceitar a der­rota.

Sobre as redes so­ciais, foram as elei­ções em que elas ti­veram mais im­por­tância. São um es­paço de­mo­crá­tico, em­bora neste pro­cesso elei­toral te­nham sido usadas para in­to­xicar in­for­ma­ções e des­qua­li­ficar os ri­vais. Há al­guns meses o go­verno tentou re­gular por leis o twitter, fa­ce­book, mas afor­tu­na­da­mente a pressão so­cial não per­mitiu que os pro­jetos fossem adi­ante. Assim, con­ti­nuam sendo um es­paço bas­tante aberto e, de fato, foram muito ativas nas elei­ções, em es­pe­cial na mão dos jo­vens, para além da guerra suja que nelas foi de­sen­vol­vida.

Cor­reio da Ci­da­dania: Você já tinha dito que, qual­quer fosse o ven­cedor, vem pela frente o fa­mi­ge­rado ajuste fiscal, algo muito cri­ti­cado pelas es­querdas em qual­quer lugar. Por que isso teria de ser feito também no Equador, a exemplo dos vi­zi­nhos da re­gião, in­de­pen­den­te­mente dos go­vernos da vez?

Decio Ma­chado: Trata-se do cha­mado fim de ciclo econô­mico, como muitos têm dito. No Brasil, isso se sim­bo­lizou num dis­cu­tível im­pe­a­ch­ment. Na Ar­gen­tina já acon­teceu o mesmo e aqui também su­ce­derá, mesmo porque as po­lí­ticas do go­verno Correa mu­daram ao longo dos anos.

Agora, o go­verno tenta pri­va­tizar as mesmas em­presas que tinha sal­vado da pri­va­ti­zação em seu pri­meiro mo­mento. As mesmas em­presas que ele re­cu­perou e for­ta­leceu - de ser­viços pú­blicos, a linha aérea na­ci­onal, me­ga­pro­jetos hi­dráu­licos - agora estão à venda no mer­cado, pois não há di­nheiro de­pois da queda do preço das ma­té­rias primas no mer­cado global.

E há vá­rias ou­tras coisas por vir, como fle­xi­bi­li­zação das leis do tra­balho, que não ocor­reram nos anos an­te­ri­ores. Pois o fim de ciclo também se vê no Equador, na ver­dade é vi­sível nos úl­timos três anos, para além de qual­quer re­sul­tado elei­toral.

A pró­pria dí­vida ex­terna, di­mi­nuída dras­ti­ca­mente no fim da dé­cada pas­sada, agora volta aos pa­ta­mares dos anos de go­verno ne­o­li­beral, pois ti­vemos uma agres­siva po­lí­tica de en­di­vi­da­mento pú­blico nesses úl­timos anos.

Cor­reio da Ci­da­dania: À es­querda do cor­reísmo, o que você pode co­mentar dessa dis­si­dência de ca­ráter in­dí­gena, mo­vi­mento que no Equador tem muito mais força e uni­dade do que, apesar das mu­danças de pa­tamar re­centes, es­tamos acos­tu­mados a ver no Brasil? Como é a di­nâ­mica desses grupos e por que se ra­di­ca­lizou tanto no dis­tan­ci­a­mento do go­verno Correa?

Decio Ma­chado: De fato, os in­dí­genas têm pro­ta­go­nismo po­lí­tico no Equador desde 1990, quando ti­veram sua pri­mera grande mo­bi­li­zação, sim­bo­li­zada na marcha re­a­li­zada na­quele ano pelos seus di­reitos. O Equador é um país al­ta­mente ra­cista quanto aos in­dí­genas, e desde os anos 90 eles estão en­vol­vidos na po­lí­tica na­ci­onal.

O mo­vi­mento in­dí­gena está or­ga­ni­zada na CO­NAIE (Con­fe­de­ração Na­ci­onal dos Povos In­dí­genas do Equador), e também há um par­tido para as dis­putas elei­to­rais – Pa­cha­kutik. Eles nunca apoi­aram di­re­ta­mente o go­verno Correa, mesmo em 2006 apre­sen­taram sua pró­pria can­di­da­tura, e du­rante o pro­cesso cons­ti­tuinte de 2007-08 apoi­aram a ini­ci­a­tiva do go­verno que aprovou uma nova Cons­ti­tuição, re­co­nhe­ce­dora do país como plu­ri­na­ci­onal, apesar de não ter muita apli­cação prá­tica.

Acon­tece que eles têm outra vin­cu­lação com a na­tu­reza, sua pró­pria fi­lo­sofia, ex­pres­sada na ideia da Suma Kausay, ou o cha­mado Bem Viver, de pro­teção de ter­ri­tório. E os com­pro­missos es­ta­be­le­cidos pelo go­verno não foram cum­pridos. Correa fez uma forte aposta no ex­tra­ti­vismo e isso gera uma grande con­fron­tação.

Boa parte dos grandes pro­jetos do go­verno Correa é em ter­ri­tó­rios an­ces­trais, que per­tencem aos in­dí­genas, tal como Belo Monte no Brasil. Di­ante disso, o go­verno optou por re­primir a re­sis­tência e suas mo­bi­li­za­ções po­pu­lares com força, tal como o go­verno Dilma fez em junho de 2013 e em 2014. É o ex­tra­ti­vismo que gera fortes con­fron­ta­ções contra o go­verno, mas não são só os in­dí­genas. Ou­tros mo­vi­mentos so­ciais, como o de mu­lheres, am­bi­en­ta­listas e al­guns se­tores de jo­vens ur­banos também têm di­ver­gên­cias com o cor­reísmo.

Em suma, existe uma dis­puta entre Es­tado e mo­vi­mentos so­ciais, o que levou os in­dí­genas a fa­zerem uma forte opo­sição.

Cor­reio da Ci­da­dania: No plano in­ter­na­ci­onal, o que co­menta do papel do Equador na me­di­ação entre go­verno co­lom­biano e o ELN (Exér­cito de Li­ber­tação Na­ci­onal, guer­rilha de abran­gência in­fe­rior às FARCs), uma das fa­cetas do acordo de paz em ne­go­ci­ação neste país?

Decio Ma­chado: É im­por­tante. O Equador apostou forte na in­te­gração re­gi­onal e tem uma po­lí­tica ativa na Amé­rica do Sul. É um país pe­queno em termos de in­fluência se com­pa­ramos com Brasil ou Ar­gen­tina, mas tem uma po­lí­tica ativa a este res­peito.

Dentro de tal con­texto, se ofe­receu como in­ter­me­diário de uma das partes dos diá­logos de paz que a Colômbia vive. As ne­go­ci­a­ções não são pú­blicas, os meios de co­mu­ni­cação não estão nas ne­go­ci­a­ções, e al­guns co­men­tá­rios e aná­lises só serão le­vados a pú­blico após o tér­mino de al­gumas mesas de ne­go­ci­ação.

De­pois, as con­versas vão girar por ou­tros países, in­clu­sive o Brasil, pas­sarão por um pu­nhado de países da re­gião e vol­tarão ao Equador para se en­cer­rarem, o que re­força o papel ativo do go­verno equa­to­riano nos diá­logos entre go­verno e in­sur­gência co­lom­bi­anos.

A en­tre­vista foi gra­vada no pro­grama Co­nexão Su­daca.

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