viernes, 17 de febrero de 2017

Equador: incertezas nas eleições presidenciais

Por Decio Machado
Correio da Cidadania



Neste 19 de fe­ve­reiro, o Equador en­frenta suas pri­meiras elei­ções pre­si­den­ciais nos úl­timos 10 anos e meio sem o nome de Ra­fael Correa Del­gado na cé­dula de vo­tação. En­tender a as­censão da Ali­ança PAÍS e Ra­fael Correa ao poder im­plica com­pre­ender também suas ori­gens, com a con­for­mação deste par­tido po­lí­tico a apenas oito meses das elei­ções de 2006, onde se de­ter­minou a pri­meira das múl­ti­plas vi­tó­rias elei­to­rais cor­reístas nesta dé­cada.

An­te­ce­dentes ime­di­atos do “cor­reísmo” 

Tal como acon­tecia no resto da re­gião, no Equador se vivia desde a dé­cada de 90 um marco de ins­ta­bi­li­dade po­lí­tica, fruto de um aper­tado ciclo de le­vantes po­pu­lares e grandes mo­bi­li­za­ções que con­du­ziram três pre­si­dentes cons­ti­tu­ci­o­nal­mente eleitos à queda (Ab­dalá Bu­caram em 1997, Jamil Mahuad em 2000 e Lucio Gu­tiérrez em 2005), com o con­se­guinte des­cré­dito do re­gime de par­tidos, das ins­ti­tui­ções po­lí­ticas equa­to­ri­anas e do sis­tema econô­mico ne­o­li­beral im­plan­tado de­pois do es­touro da crise da dí­vida ex­terna de 1982. A saída da crise ad­veio da pro­gres­siva cons­trução de um mo­delo em­pre­sa­rial de de­sen­vol­vi­mento, con­so­li­dado a partir do go­verno de Sixto Durán Ballén (1992-1996) e am­pliado pelos go­vernos su­ces­sores. 

Este pe­ríodo pode ser de­fi­nido como a fase ini­cial da mo­der­ni­zação do ca­pi­ta­lismo equa­to­riano, du­rante o qual se me­lho­raram os lu­cros em­pre­sa­riais, às custas da de­te­ri­o­ração dos ser­viços pú­blicos, en­co­lhi­mento do papel e ta­manho do Es­tado, a con­cen­tração da ri­queza, a des­re­gu­lação tri­bu­tária, a pre­ca­ri­zação la­boral e, a partir da quebra fi­nan­ceira (1998-2000) e da perda da so­be­rania mo­ne­tária através da do­la­ri­zação do país, com a ex­plosão do fenô­meno mi­gra­tório equa­to­riano.

Neste con­texto no qual, entre maio e junho de 1990, to­mava forma o pri­meiro le­vante dos povos e na­ci­o­na­li­dades in­dí­genas do Equador. Suas de­mandas, de de­zes­seis pontos, tra­tavam da de­fesa e rei­vin­di­cação de seus di­reitos, ter­ri­tó­rios, jus­tiça e li­ber­dade.

O “Le­vante do Inti Raymi” con­so­lidou o mo­vi­mento in­dí­gena como um su­jeito pro­ta­go­nista das lutas so­ciais equa­to­ri­anas du­rante um pe­ríodo que se pro­longou entre 1990 e 2005, pas­sando da re­sis­tência po­pular ao co­go­verno du­rante uma breve etapa do go­verno de Lucio Gu­ti­errez. Con­ver­tido o mo­vi­mento po­lí­tico de­no­mi­nado Pa­cha­kutik na prin­cipal força de opo­sição ao ajuste es­tru­tural im­ple­men­tado no Equador desde as ins­ti­tui­ções de Bretton Woods, sua par­ti­ci­pação na gestão go­ver­na­mental – o que ini­ci­al­mente foi con­si­de­rado um triunfo – ge­raria uma crise in­terna, da qual o mo­vi­mento in­dí­gena em seu con­junto ainda não foi capaz de le­vantar a ca­beça. Isso fez com que o ce­nário po­lí­tico mu­dasse e ga­nhassem força as de­mandas ci­dadãs, em torno das quais se aglu­ti­naram as classes e se­tores mé­dios ur­banos. Isso pro­pi­ci­aria a “re­volta dos fo­ra­gidos” e a queda do go­verno gu­ti­er­rista em abril de 2005, úl­tima crise go­ver­na­mental vi­vida neste pe­queno país an­dino.

É a partir deste preâm­bulo que fica fac­tível a cons­trução, apenas meses antes do pri­meiro turno das elei­ções pre­si­den­ciais de 2006, de um fenô­meno po­lí­tico novo, que, no en­tanto, foi tre­men­da­mente eficaz nas urnas: a con­for­mação da Ali­ança PAÍS, sob li­de­rança de um jovem pro­fessor uni­ver­si­tário, Ra­fael Correa, cuja ex­pe­ri­ência po­lí­tica era alheia às lutas dos mo­vi­mentos so­ciais lo­cais e cujo único an­te­ce­dente po­lí­tico era ter ocu­pado du­rante quatro meses o cargo de mi­nistro da Eco­nomia do go­verno an­te­rior à sua eleição.   

A dé­cada cor­reísta 

De­pois de sua posse, a 15 de ja­neiro de 2007, o ob­je­tivo do go­verno do pre­si­dente Correa foi abordar um se­gundo pro­cesso de mo­der­ni­zação ca­pi­ta­lista do país, desta vez me­di­ante a reins­ti­tu­ci­o­na­li­zação e forte in­ter­venção do Es­tado, re­cu­pe­rando a ins­ti­tu­ci­o­na­li­dade pú­blica e a re­le­gi­ti­mação do sis­tema de re­pre­sen­tação po­lí­tica ins­ti­tu­ci­onal. Os ideó­logos do cor­reísmo cha­ma­riam isso de cons­trução de uma so­ci­e­dade “pós-ne­o­li­beral”, im­ple­men­tando um pro­cesso de re­formas por fases, que pre­tendia como ob­je­tivo da cons­trução de um se­gundo mo­mento que po­de­ríamos de­finir como “so­ci­a­lismo de mer­cado” (ca­pi­ta­lismo po­pular), para ter­minar em um ter­ceiro es­tágio, que acharam por bem de­finir como “bi­os­so­ci­a­lismo” (uma so­ci­e­dade de au­to­cons­ci­ência im­ple­men­tada sob os prin­cí­pios ci­vi­li­za­tó­rios do “Bem Viver”).

Na prá­tica, e de­pois de mais de dez anos de go­verno do pre­si­dente Ra­fael Correa, po­demos as­se­verar que o pro­cesso não foi capaz de passar de sua pri­meira fase. Seria o pró­prio pre­si­dente Correa quem, com a se­guinte frase, de­fi­niria de forma ade­quada sua gestão frente ao pú­blico: “ba­si­ca­mente, es­tamos fa­zendo me­lhor as coisas com o mesmo mo­delo de acu­mu­lação, antes de mudá-lo, porque não é nosso de­sejo pre­ju­dicar os ricos, mas, sim, é nossa in­tenção ter uma so­ci­e­dade mais justa e equi­ta­tiva” (Diário El Te­le­grafo, 15 de ja­neiro de 2012). 

Ainda assim, che­gado o ano de 2013, o fim do pe­ríodo co­nhe­cido po­pu­lar­mente na Amé­rica La­tina como “a dé­cada dou­rada ou o boom das ma­té­rias-primas”, as po­lí­ticas pú­blicas cor­reístas so­freram uma forte in­vo­lução de­vido à falta de li­quidez econô­mica go­ver­na­mental.

Dentro desta in­vo­lução, des­tacam-se fatos como a am­pli­ação da fron­teira pe­tro­lí­fera, com seu cor­res­pon­dente im­pacto so­cial e am­bi­ental sobre o con­junto de ter­ri­tó­rios ori­gi­ná­rios dos povos e na­ci­o­na­li­dades in­dí­genas an­ces­trais; a en­trega dos campos ma­duros (co­nhe­cidos no mundo pe­tro­leiro como as joias da coroa) a trans­na­ci­o­nais ex­tra­ti­vistas es­tran­geiras; a con­cessão sem li­ci­tação pú­blica de vá­rios portos es­tra­té­gicos do país a grupos de ca­pital es­tran­geiro; o apoio aos grandes do agro­ne­gócio, em de­tri­mento da so­be­rania ali­mentar na­ci­onal; um pro­cesso de fle­xi­bi­li­zação la­boral que per­mite a re­dução das horas de tra­balho das e dos ope­rá­rios(as); a volta da vi­gi­lância sobre a eco­nomia na­ci­onal pelo FMI; assim como o atual pro­cesso em marcha de pri­va­ti­zação de hi­dro­e­lé­tricas, em­presas de gás e ou­tras em­presas pú­blicas que, ini­ci­al­mente, foram res­ga­tadas du­rante a pri­meira fase deste pro­cesso po­lí­tico au­to­de­no­mi­nado pro­pa­gan­dis­ti­ca­mente como “Re­vo­lução Ci­dadã”. 

O cor­reísmo, tal como ou­tros go­vernos pro­gres­sistas da re­gião, ca­rac­te­rizou-se du­rante seus anos de bo­nança econô­mica por im­pul­si­onar po­lí­ticas so­ciais com­pen­sa­tó­rias, que foram a base da nova go­ver­na­bi­li­dade, a par da que exa­cerbou o mo­delo de ex­plo­ração ex­tra­ti­vista de re­cursos na­tu­rais, for­ta­le­cendo um Es­tado que tinha fi­cado re­du­zido à mí­nima ex­pressão du­rante o pe­ríodo ne­o­li­beral. Fo­mentou-se am­pla­mente a cons­trução de obras de in­fra­es­tru­tura no país, na busca de de­sen­volver certa com­pe­ti­vi­dade sis­tê­mica (cri­ação de um en­torno sus­ten­tador que possa con­duzir a um de­sen­vol­vi­mento ace­le­rado, a buscar van­ta­gens com­pe­ti­tivas para o in­ves­ti­mento pri­vado na­ci­onal e es­tran­geiro). 

A gestão cor­reísta du­rante o pe­ríodo de bo­nança econô­mica (a ar­re­ca­dação do Es­tado equa­to­riano entre 2007 e 2015 foi de 221 bi­lhões de dó­lares, o que sig­ni­ficou uma re­ceita média 3,84 vezes su­pe­rior à ar­re­ca­dação ve­ri­fi­cada entre os anos de 2000 e 2006) per­mitiu que a po­breza pela renda se re­du­zisse em torno de 12 pontos, pas­sando o sa­lário bá­sico de 160 dó­lares em 2006 a 340 dó­lares em 2013; também per­mitiu que o Es­tado in­ves­tisse apro­xi­ma­da­mente 13,5 bi­lhões de dó­lares em saúde, im­pul­si­o­nando a cons­trução de hos­pi­tais e ou­tras in­fra­es­tru­turas sa­ni­tá­rias; per­mitiu que em ma­téria de Edu­cação se tenha in­cre­men­tado a taxa de ma­trí­cula em Edu­cação bá­sica de 92% para 96%, sendo seis pontos per­cen­tuais em na po­pu­lação mais pobre; e per­mitiu que o Es­tado tenha in­ter­vindo em 9000 quilô­me­tros de es­tradas du­rante esta dé­cada. 

O cres­ci­mento da renda per ca­pita du­rante re­fe­rido pe­ríodo ativou a “po­pu­la­ri­zação” do sis­tema fi­nan­ceiro pri­vado (fa­ci­li­dade de acesso ao cré­dito para fa­mí­lias hu­mildes a fim de in­cen­tivar o con­sumo), o que con­so­lidou um ca­pital emer­gente que, ao en­focar seus cri­té­rios de ren­ta­bi­li­dade no mer­cado fi­nan­ceiro in­terno, agravou o pro­blema já an­te­ri­or­mente exis­tente, no caso, de con­trole das em­presas mo­no­pó­licas sobre os dis­tintos se­tores do mer­cado na­ci­onal equa­to­riano. 

É assim que a in­ter­venção do Es­tado na di­na­mi­zação da eco­nomia, prin­cipal ca­rac­te­rís­tica do so­ci­a­lismo do sé­culo 21, sig­ni­ficou que o gasto de in­ves­ti­mento pas­sara de 11,4% do Or­ça­mento Geral do Es­tado em 2008 a 20,5% em 2013, en­quanto os grandes grupos econô­micos que operam no mer­cado na­ci­onal in­cre­men­taram em quase 40% suas re­ceitas. Em poucas pa­la­vras, as mai­ores em­presas que operam no mer­cado equa­to­riano ga­nharam du­rante o pe­ríodo pro­gres­sista subs­tan­ci­al­mente mais que du­rante os anos an­te­ri­ores à che­gada do pre­si­dente Ra­fael Correa ao Pa­lácio de Ca­ron­delet. Assim, em 2006, com um PIB de 46,8 bi­lhões de dó­lares, as 300 mai­ores em­presas do Equador en­traram com 20,363 bi­lhões de dó­lares, o que vem a sig­ni­ficar 43,6% do PIB.

Apenas seis anos de­pois, em 2012, e com um PIB de 84,7 bi­lhões de dó­lares (quase o dobro de 2006), as mesmas em­presas en­traram com 39,289 bi­lhões de dó­lares, o que im­plica três pontos per­cen­tuais a mais no PIB na­ci­onal. Mesmo assim, desde que co­me­çara a queda em 2013 dos preços das ma­té­rias primas no mer­cado global, o país en­trou em uma crise econô­mica que é fruto da falta de mu­danças es­tru­tu­rais no âm­bito econô­mico. Três fa­tores ex­ternos (queda do preço do pe­tróleo, apre­ci­ação do dólar e en­ca­re­ci­mento do fi­nan­ci­a­mento ex­terno), so­mados à falta de di­ver­si­fi­cação pro­du­tiva in­terna, aba­laram se­ri­a­mente o país.

O Equador pos­suir uma es­tru­tura pro­du­tiva al­ta­mente de­pen­dente das ex­por­ta­ções de óleo cru e ou­tros bens pri­má­rios, assim como da im­por­tação de pro­dutos ela­bo­rados para seu bom de­sen­vol­vi­mento. Isso fez com que, quando as ex­por­ta­ções pri­má­rias de­cres­ceram, o país tenha vol­tado ao ca­minho do en­di­vi­da­mento ex­terno e que a eco­nomia equa­to­riana tenha se con­traído, em 2015, em 1,7% do PIB.

O cha­mado “so­ci­a­lismo do sé­culo 21” no Equador não foi capaz, por inépcia ou falta de von­tade po­lí­tica, de trans­formar a ma­triz de acu­mu­lação ca­pi­ta­lista her­dada do ne­o­li­be­ra­lismo. Isso im­plica que a es­tru­tura pro­du­tiva na­ci­onal se man­tenha con­cen­trada em poucos grupos econô­micos que exercem seu con­trole sobre os dis­tintos se­tores da eco­nomia na­ci­onal, apesar de serem baixos ge­ra­dores de em­prego. Os pe­quenos em­pre­en­di­mentos que dão em­prego a até 9 pes­soas geram 70% do em­prego na­ci­onal, en­quanto as em­presas que em­pregam de 100 pes­soas em di­ante con­cen­tram ao redor da me­tade das re­ceitas econô­micas do país. O fisco equa­to­riano re­co­nhece a exis­tência de 118 grandes grupos econô­micos que operam no mer­cado na­ci­onal, dos quais 16 con­trolam a maior parte da eco­nomia. As po­lí­ticas fis­cais e pro­du­tivas de­sen­vol­vidas nos úl­timos anos per­mi­tiram uma série de ex­ce­ções fis­cais que de­ter­minam o fato de a pressão fiscal não re­cair sobre as grandes em­presas, ar­re­ca­dando-se dessas apenas 15% do mon­tante do Im­posto de Renda.

De ta­bela, a atual de­te­ri­o­ração da eco­nomia equa­to­riana faz com que os in­di­ca­dores so­ciais po­si­tivos con­quis­tados du­rante grande parte do pe­ríodo cor­reísta no âm­bito da di­mi­nuição da po­breza, a di­mi­nuição do em­prego ou as me­lho­rias em ma­téria de ca­pa­ci­dade aqui­si­tiva da po­pu­lação, se en­con­trem na atu­a­li­dade em franca de­ca­dência. Para ofe­recer apenas um par de exem­plos sobre esta afir­mação: du­rante o exer­cício 2015 se per­deram 340000 postos de tra­balho digno no país, en­quanto que o au­mento do sa­lário bá­sico para 2017 equi­vale a 30 cen­tavos de dólar por dia, o que não dá pra fi­nan­ciar, no acu­mu­lado de uma se­mana, um triste prato de co­mida no re­fei­tório po­pular mais ba­rato da ci­dade de Quito. 

A questão se agrava à me­dida que o au­mento re­la­tivo da ca­pa­ci­dade aqui­si­tiva da po­pu­lação equa­to­riana du­rante a etapa de bo­nança con­duziu a uma po­lí­tica in­terna de de­mo­cra­ti­zação do acesso ao con­sumo, que no fim das contas de­rivou em um forte cres­ci­mento do en­di­vi­da­mento fa­mi­liar. Se­gundo um es­tudo do Co­légio de Eco­no­mistas de Pi­chincha, 41% dos lares equa­to­ri­anos gastam mais do que ga­nham, sendo as pes­soas mais en­di­vi­dadas as que menos renda au­ferem (en­di­vi­da­mento maior entre os po­bres).

É esta nova con­dição econô­mica que atra­vessa o país que fez o cor­reísmo perder le­gi­ti­mi­dade so­cial du­rante os úl­timos três anos do man­dato de Ra­fael Correa. A crise he­gemô­nica ne­o­li­beral não con­duziu o Equador a uma im­ple­men­tação de um mo­delo pós-ne­o­li­beral an­co­rado em um pro­jeto de trans­for­mação so­cial e econô­mica. O cor­reísmo é apenas um exemplo mais de ló­gicas ilu­só­rias ca­pi­ta­listas, que pre­tendem com­binar cres­ci­mento ca­pi­ta­lista su­bor­di­nado e eman­ci­pação so­cial. E com uma grande dose pro­pa­gan­dís­tica de ra­di­ca­li­dade dis­cur­siva.

Atu­al­mente, fica evi­dente que o cons­truído em ma­téria de me­lho­ra­mento dos in­di­ca­dores so­ciais ao longo deste pe­ríodo tem pi­lares de­ma­si­a­da­mente frá­geis. Dita con­dição nos deve fazer re­fletir, aqui e em ou­tros lu­gares, sobre o fato de que não é pos­sível me­lhorar es­tru­tu­ral­mente a si­tu­ação dos mais po­bres sem tocar os pri­vi­lé­gios das elites econô­micas e dos grandes grupos de poder.

A atual dis­puta elei­toral 

O fato de que Ra­fael Correa não es­teja na cé­dula de vo­tação, so­mado à con­dição de de­te­ri­o­ração econô­mica que vive o país, per­mitiu aos se­tores da opo­sição po­lí­tica as­pi­rarem pela pri­meira vez, de forma séria, ga­nhar a pró­xima eleição.  

Mesmo assim, as ri­va­li­dades exis­tentes entre as dis­tintas fa­mí­lias que con­formam o con­ser­va­do­rismo equa­to­riano não lhes per­mitiu de­sen­volver uma es­tra­tégia de uni­dade si­milar à que, em algum mo­mento, de­sen­volveu a opo­sição da Ve­ne­zuela. Isso faz com que existam duas fac­ções en­fren­tadas na di­reita equa­to­riana. Uma en­ca­be­çada por um mag­nata pro­pri­e­tário de um dos prin­ci­pais bancos do país (Guil­lermo Lasso) e outra por uma po­lí­tica da velha di­reita so­cial-cristã (Cynthia Vi­teri).

Cons­ci­entes de que não podem ga­nhar as elei­ções pre­si­den­ciais se­pa­ra­da­mente, o ob­je­tivo de ambos é forçar o se­gundo turno, ten­tando se po­si­ci­onar, cada um deles, como con­tendor final do con­ti­nuísmo go­ver­nista. De se con­se­guir tal ob­je­tivo, se ar­ti­cu­laria uma ali­ança de quase to­ta­li­dade de forças opo­si­toras para apoiar a can­di­da­tura con­ser­va­dora. Apesar do an­te­rior, até agora ambas as fac­ções da di­reita se con­fron­taram di­a­lé­tica e até fi­si­ca­mente, em ce­ná­rios de apa­rição con­junta. Tudo isso apesar de suas pro­postas elei­to­rais serem si­mi­lares e terem como pro­posta a reim­plan­tação do ne­o­li­be­ra­lismo no Equador.

No âm­bito das es­querdas dis­si­dentes do re­gime, se ali­nharam um con­junto de forças opo­si­toras cujo leque abarca po­si­ções ide­o­ló­gicas que vão desde a so­ci­al­de­mo­cracia li­beral (en­car­nada pela re­cons­ti­tuição do par­tido Es­querda De­mo­crá­tica), até múl­ti­plos se­tores que foram pouco a pouco fi­cando ex­cluídos do go­verno cor­reísta, pas­sando pelo pró­prio Pa­cha­kutik e a Uni­dade Po­pular (um re­con­ver­tido e muito re­du­zido par­tido ma­oísta que no pas­sado se chamou Mo­vi­mento De­mo­crá­tico Po­pular). 

Essa ali­ança elei­toral, que na prá­tica ca­rece de ho­mo­ge­nei­dade ide­o­ló­gica e goza de es­cassas ex­pec­ta­tivas de vi­tória, se agrupa em torno da can­di­da­tura do ge­neral Paco Mon­cayo, um velho mi­litar de corte na­ci­o­na­lista que al­cançou a no­to­ri­e­dade em 1995 como co­man­dante em chefe das Forças Ar­madas do Equador em seu con­flito mi­litar com o Peru. Mon­cayo é pre­cursor do que no país se con­ven­ci­onou chamar, em um átimo de ima­gi­nação inu­si­tada, “mi­li­ta­rismo ilus­trado”.

Nos úl­timos dias, as pes­quisas mais sé­rias no país in­dicam que o par­tido do go­verno (Ali­ança PAÍS) baixa pau­la­ti­na­mente sua in­tenção de voto de­vido aos in­ces­santes es­cân­dalos de cor­rupção ins­ti­tu­ci­onal que estão apa­re­cendo quase de forma diária na im­prensa. O de­senho é es­tra­té­gico e sem dú­vida ela­bo­rado por uma opo­sição con­ser­va­dora, que aguarda até a cam­panha elei­toral para, com a cum­pli­ci­dade da mídia pri­vada, po­si­ci­onar uma larga lista de de­pra­vados casos go­ver­na­men­tais que dão luz à de­com­po­sição ética do re­gime.

Essa cam­panha elei­toral se tornou, para a Ali­ança PAÍS, uma es­pécie de cor­rida contra o re­lógio, pois mesmo que se man­tenha como opção pre­fe­ren­cial do elei­to­rado equa­to­riano, sua queda na in­tenção de voto é sus­ten­tada e suas es­tra­té­gias contam os dias que faltam de cam­panha entre as an­gús­tias da po­dridão que se sente ao seu redor. 

Para ga­nhar o pri­meiro turno com maior ab­so­luta, a Ali­ança PAÍS pre­cisa de 40% dos votos va­lidos, com 10% de van­tagem sobre o se­cundo lugar. Dita con­dição co­meça a se co­locar em questão, ainda que o go­verno conte com o apoio de um Con­selho Na­ci­onal Elei­toral (órgão con­dutor da de­mo­cracia do país, mas cuja com­po­sição é in­tei­ra­mente go­ver­nista) e cuja im­par­ci­a­li­dade elei­toral está sob questão. Pa­ra­le­la­mente, o par­tido CREO (Acre­dito) li­de­rado por Guil­lermo Lasso (prin­cipal força opo­si­tora) aposta pela opção es­co­lhida no úl­timo dia por parte deste 30% do elei­to­rado que nas úl­timas elei­ções votou em Correa, mas atu­al­mente se de­fine como in­de­ciso – apesar da al­tura em que nos en­con­tramos na cam­panha elei­toral e de que o voto no  Equador seja obri­ga­tório para os ci­da­dãos entre 18 e 65 anos.

Em todo caso, e mais além da opção po­lí­tica que vença a eleição, o pró­ximo go­verno se verá obri­gado a pro­ceder um plano de ajuste que con­du­zirá à re­dução do in­ves­ti­mento pú­blico e uma re­ne­go­ci­ação dos pa­ga­mentos da dí­vida ex­terna con­traída du­rante os úl­timos anos pelo re­gime. Ade­mais, basta ouvir os dis­cursos dos prin­ci­pais pre­si­den­ciá­veis para en­tender que os planos de­se­nhados para a saída da atual crise re­cairão, com todas as luzes, sobre as costas dos e das tra­ba­lha­doras. 

É es­perar que, com base no an­te­rior, e com um go­verno que já não go­zará de le­gi­ti­mi­dade so­cial e po­lí­tica sobre a qual se sus­tentou nos pri­meiros sete anos de go­verno cor­reísta, exista uma re­com­po­sição do te­cido so­cial equa­to­riano. Será apenas através da mo­bi­li­zação so­cial que se re­em­po­de­rarão os mo­vi­mentos so­ciais equa­to­ri­anos, esses que pro­ta­go­ni­zaram em seu mo­mento as lutas de re­sis­tência ao ne­o­li­be­ra­lismo, per­mi­tindo um acú­mulo his­tó­rico que levou a Ali­ança PAÍS ao poder, e que hoje se sentem frau­dados pela ação de um go­verno que disse re­pre­sentá-los. 


Decio Ma­chado é so­ció­logo e con­sultor po­lí­tico re­si­dente no Equador.
Pu­bli­cado ori­gi­nal­mente em Vi­ento Sur.
Tra­du­zido por Ga­briel Brito, do Cor­reio da Ci­da­dania.

miércoles, 8 de febrero de 2017

Incertidumbres ante las próximas elecciones presidenciales

Por Decio Machado
Publicado en Revista Viento Sur

El próximo 19 de febrero Ecuador enfrenta sus primeras elecciones presidenciales en los últimos 10 años y medio sin que el nombre de Rafael Correa Delgado esté en la papeleta de votación.

Entender el ascenso de Alianza PAIS y Rafael Correa al poder, implica entender también sus orígenes, con la conformación de este partido político tan sólo ocho meses antes del proceso electoral del 2006, donde se determinó la primera de las múltiples victorias electorales correístas durante esta década.

Antecedentes inmediatos al correísmo

Al igual que lo que sucedía en el resto de la región, en Ecuador se vivía desde la década de 1990 en un marco de inestabilidad política fruto de un apretado ciclo de levantamientos populares y grandes movilizaciones que conllevaron al derrocamiento de tres presidentes constitucionalmente elegidos (Abdalá Bucaram en 1997, Jamil Mahuad en 2000 y Lucio Gutiérrez en 2005), con el consiguiente descrédito del régimen de partidos, de las instituciones políticas ecuatorianas y del sistema económico neoliberal implementado tras el estallido de la crisis de la deuda externa en 1982. La salida de esta crisis devino en la progresiva construcción de un modelo empresarial de desarrollo que fue consolidado a partir del gobierno de Sixto Durán Ballén (1992-1996) y que fue ampliado por los gobiernos sucesores.

Este período puede ser definido como la fase inicial de la modernización del capitalismo ecuatoriano, durante el cual se mejoraron los beneficios empresariales a costa del deterioro del los servicios públicos, el achicamiento del rol y el tamaño del Estado, la concentración de la riqueza, la desregulación tributaria, la precarización laboral y a partir del crack financiero (1998-2000) y la pérdida de soberanía monetaria a través de la dolarización del país, con la explosión del fenómeno migratorio ecuatoriano.

Es en ese contexto en el cual entre mayo y junio de 1990 tomaba forma el primer levantamiento de los pueblos y nacionalidades indígenas del Ecuador. Sus demandas, dieciséis puntos, recogían la defensa y reivindicación de sus derechos, territorios, la justicia y la libertad.

El “levantamiento del Inti Raymi” consolidó al movimiento indígena como un sujeto protagónico en las luchas sociales ecuatorianas durante un período que se prolongó entre 1990 y 2005, pasando de la resistencia popular al cogobierno durante una breve etapa del gobierno de Lucio Gutiérrez. Convertido el movimiento político Pachakutik en la principal fuerza de oposición al ajuste estructural implementado en Ecuador desde las instituciones de Bretton Woods, su participación en la gestión gubernamental –lo que inicialmente se consideró un triunfo- generaría una crisis interna de la cual el movimiento indígena en su conjunto aún no ha sido capaz de levantar cabeza. Ello hace que el escenario político cambie y tomen fuerza las demandas ciudadanas, en torno a las cuales se aglutinaron las clases y capas medias urbanas. Esto propiciará la “revuelta de los forajidos” y la caída del gobierno gutierrista en abril de 2005, última crisis gubernamental vivida en este pequeño país andino.

Es desde este preámbulo que resulta factible la construcción, apenas unos meses antes de la primera vuelta de las elecciones presidenciales del 2006, de un fenómeno político nuevo pero que electoralmente resultó tremendamente eficaz: la conformación de Alianza PAIS bajo el liderazgo de un joven profesor universitario, Rafael Correa, cuya experiencia política era ajena a las luchas de los movimientos sociales locales y cuyo único antecedente político era haber ocupado durante cuatro meses el cargo de ministro de Economía durante el gobierno anterior a su elección.

La década correísta

Tras su investidura el 15 de enero de 2007, el objetivo del gobierno del presidente Correa fue abordar un segundo proceso de modernización capitalista en el país, esta vez mediante la reinstitucionalización y fuerte intervención del Estado, recuperando la institucionalidad pública y la relegitimación del sistema de representación política institucional. Los ideólogos del correísmo llamarían a esto la construcción de una sociedad posneoliberal, implementado un proceso de reformas por fases que pretendía como objetivo la construcción de un segundo momento que podríamos definir como “socialismo de mercado” (capitalismo popular), para terminar en un tercer estadio que tuvieron a bien definir como “biosocialismo” (una sociedad de autoconciencia implementada bajo los principios civilizatorios del Buen Vivir).

En la práctica y tras más de diez años de gobierno del presidente Rafael Correa, podemos aseverar que el proceso no ha sido capaz de pasar de su primera fase. Sería el propio presidente Correa quien con la siguiente frase definiría de forma adecuada su gestión ante un medio público: “básicamente estamos haciendo mejor las cosas con el mismo modelo de acumulación, antes de cambiarlo, porque no es nuestro deseo perjudicar a los ricos, pero sí es nuestra intención tener una sociedad más justa y equitativa” (Diario El Telégrafo, 15 de enero de 2012). Sin embargo, llegado en el año 2013 el fin del período conocido popularmente en América Latina como la “década dorada o del boom de las materias primas”, las políticas públicas correístas sufrieron una fuerte involución debido a la falta de liquidez económica gubernamental. Dentro de esta involución destacan hechos como la ampliación de la frontera petrolera con su correspondiente impacto social y ambiental sobre el conjunto de territorios originarios de los pueblos y nacionalidades indígenas ancestrales; la entrega de los campos maduros (conocidos en el mundo petrolero como las “joyas de la corona”) a transnacionales extractivas extranjeras; la concesión sin licitación pública de varios puertos estratégicos del país a grupos de capital extranjeros; el apoyo a los grandes del agronegocio en detrimento de la soberanía alimentaria nacional; un proceso de flexibilización laboral que permite la reducción de las horas trabajo de las y los operarios; la vuelta de la vigilancia sobre la economía nacional a manos del FMI; así como el actual proceso en marcha para la privatización de hidroeléctricas, gasolineras y otras empresas públicas que inicialmente fueron rescatadas durante la primera fase de este proceso político autodenominado propagandísticamente como revolución ciudadana.

El correísmo, al igual que otros gobiernos progresistas de la región, se caracterizó durante sus años de bonanza económica por impulsar políticas sociales compensatorias que fueron la base de esta nueva gobernabilidad a la par que exacerbó el modelo de explotación extractivista de recursos naturales, fortaleciendo un Estado que había quedado reducido a su mínima expresión durante el período neoliberal y fomentando ampliamente la construcción de obras de infraestructura en el país en la búsqueda de desarrollar cierta competitividad sistémica (creación de un entorno sustentador que pueda conducir a un desarrollo acelerado buscando ventajas competitivas para la inversión privada nacional y extranjera).

La gestión correísta durante el período de bonanza económica (los ingresos del Estado ecuatoriano entre 2007 y 2015 fueron de 221 mil millones de dólares, lo que significó unos ingresos promedio 3,84 veces superior a los ingresos existentes entre los años comprendidos entre 2000 y 2006) permitió que la pobreza por ingresos se redujera en torno a los 12 puntos, pasando el salario básico de 160 dólares en 2006 a 340 dólares en 2013; que el Estado invirtiese aproximadamente 13 500 millones de dólares en salud, impulsando la construcción de hospitales y otras infraestructuras sanitarias; que en materia de Educación se haya incrementado la tasa neta de matrícula en educación básica del 92% al 96%, siendo de seis puntos porcentuales el incremento de matrículas en el caso de la población más pobre; y que el Estado haya intervenido sobre 9 000 kilómetros de carreteras durante esta década.

El crecimiento de la renta per cápita durante dicho período activó la “popularización” del sistema financiero privado (facilidad de acceso al crédito para familias humildes buscando incentivar el consumo), lo que consolidó un capital emergente que enfocando sus criterios de rentabilidad hacia el mercado interno agudizó el problema ya anteriormente existente del control de empresas monopólicas sobre los distintos sectores del mercado nacional ecuatoriano.

Es así que la intervención del estado en la dinamización de la economía, principal característica del socialismo del siglo XXI, significó que el gasto de inversión pasara del 11,4% por Presupuesto General del Estado en 2008 al 20,5% en 2013, mientras los grandes grupos económicos que operan en el mercado nacional incrementaron en casi un 40% sus ingresos. En pocas palabras, las empresas más grandes que operan en el mercado ecuatoriano ganaron durante el período progresista sustantivamente más que durante los años anteriores a la llegada del presidente Rafael Correa al Palacio de Carondelet. Así, en 2006, con un PIB de 46 800 miles de millones de dólares, las 300 empresas más grandes en Ecuador ingresaron 20 363 millones de dólares, lo que viene a significar un 43,6% del PIB. Tanto solo seis años después, en 2012, y con un PIB de 84 700 millones de dólares (casi el doble que el del 2006), estas mismas empresas ingresaron 39 289 millones de dólares, lo que implica tres puntos porcentuales más sobre el PIB nacional.

Sin embargo, desde que comenzase la caída en 2013 de los precios de las materias primas en el mercado global, el país entró en una crisis económica que es fruto de la falta de cambios estructurales en el ámbito económico. Tres factores externos (caída del precio del petróleo, apreciación del dólar y encarecimiento del financiamiento externo) sumado a la falta de diversificación productiva interna han golpeado seriamente al país.

Ecuador posee una estructura productiva altamente dependiente de las exportaciones de crudo y otros bienes primarios, así como de la importación de productos elaborados para su buen desenvolvimiento. Esto hace que cuando las exportaciones primarias decrecieron el país haya vuelto a la senda del endeudamiento externo y que la economía ecuatoriana se haya contraído en 2015 un 1,7% de su PIB.

El llamado “socialismo del siglo XXI” en Ecuador no fue capaz, por incapacidad o por falta de voluntad política, de transformar la matriz de acumulación capitalista heredada del neoliberalismo. Esto implica que la estructura productiva nacional se mantenga concentrada en pocos grupos económicos que ejercen su control sobre los distintos sectores de la economía nacional, a pesar de que sean bajos generadores de empleo. Los pequeños emprendimientos que dan empleo hasta 9 personas generan el 70% del empleo nacional, mientras que las empresas que emplean desde 100 personas en adelante concentran alrededor de la mitad de los ingresos de la economía del país. El fisco ecuatoriano reconoce la existencia de 118 grandes grupos económicos que operan en el mercado nacional, de los cuales 16 controlan la mayor parte de la economía. Las políticas fiscales y productivas desarrolladas en los últimos años permitieron una serie de excepciones fiscales que determinan el hecho de la presión fiscal no recaiga sobre las grandes empresas, recaudándose de estas tan solo el 15% del montante total del Impuesto a la Renta.

A la postre, el actual deterioro de la economía ecuatoriana conlleva que los indicadores sociales positivos logrados durante gran parte del período correísta en el ámbito de la disminución de la pobreza, la disminución del empleo o las mejoras en materia de capacidad adquisitiva de la población, se encuentren en la actualidad en franco deterioro. Por ofrecer tan solo un par de ejemplos sobre esta afirmación: durante el ejercicio 2015 se perdieron 340 000 puestos de empleo digno en el país, mientras que el incremento del salario básico para 2017 equivale a 30 centavos de dólar al día, lo que no da para financiar en su acumulado de una semana un triste plato de comida en el comedor popular más económico existente en la ciudad de Quito.

La cuestión se agrava en la medida que el incremento relativo de la capacidad adquisitiva de la población ecuatoriana durante la etapa de bonanza, conllevó a una política interna de democratización del acceso al consumo, que a la postre ha derivado en un fuerte crecimiento del endeudamiento familiar. Según un estudio del Colegio de Economistas de Pichincha, el 41% de los hogares ecuatorianos gastan más de lo que ganan, siendo las personas más endeudadas las que menos ingresos perciben (mayor endeudamiento entre los pobres).

Es esta nueva condición económica que atraviesa el país lo que ha hecho que el correísmo haya perdido legitimación social durante los últimos tres años de mandato del presidente Correa. La crisis hegemónica neoliberal no conllevó en Ecuador a la implementación de un modelo posneoliberal anclado a un proyecto de transformación social y económico. El correísmo es apenas un ejemplo más de las lógicas ilusorias capitalistas que pretenden de combinar crecimiento capitalista subordinado y emancipación social. Eso sí, todo ello con una gran dosis propagandística de radicalidad discursiva.

En la actualidad se evidencia que lo construido en materia de mejoramiento de los indicadores sociales a lo largo de este período tiene unos pilares demasiado frágiles. Dicha condición nos debe hacer reflexionar, aquí y en otros lugares, sobre el hecho de que no es posible mejorar estructuralmente la situación de los más pobres sin tocar los privilegios de las élites económicas y los grandes grupos de poder.

La actual disputa electoral

El hecho de que Rafael Correa no esté en la papeleta de votación, sumado a la condición de deterioro económico que vive el país, permitió que los sectores de la oposición política aspiraran por primera vez de forma seria a ganar el próximo proceso electoral.

Sin embargo, las rivalidades existentes entre las distintas familias que conforman el conservadurismo ecuatoriano no les ha permitido desarrollar una estrategia de unidad similar a lo que en algún momento desarrolló la oposición en Venezuela. Esto hace que existan dos facciones enfrentadas de la derecha ecuatoriana. Una encabezada por un magnate propietario de uno de los principales bancos del país (Guillermo Lasso), y otra por una política de la vieja derecha socialcristiana (Cynthia Viteri). Conscientes de que no pueden ganar las elecciones presidenciales por separado, el objetivos de ambos es forzar una segunda vuelta o balotaje, intentando posicionarse cada uno de ellos como el contendor final al continuismo oficialista. De lograr tal objetivo, se articularía una alianza de casi la totalidad de fuerzas opositoras para apoyar la candidatura conservadora. Más allá de lo anterior, en lo que va de campaña electoral, ambas facciones de la derecha han confrontado dialéctica y hasta físicamente en escenarios de aparición conjunta. Todo ello a pesar de que sus propuestas electorales sean similares y tengan como propuesta la reimplementación del neoliberalismo en Ecuador.

Desde el ámbito de las izquierdas disidentes al régimen, se alinearon un conjunto de fuerzas opositoras cuyo abanico abarca posiciones ideológicas que van desde la socialdemocracia liberal (encarnada por el reconstituído partido Izquierda Democrática), hasta múltiples sectores que han ido poco a poco quedando excluidos del gobierno correísta, pasando por el propio Pachakutik y la Unidad Popular (un reconvertido y muy disminuido partido maoísta que en el pasado se denominó Movimiento Democrático Popular).

Esta alianza electoral, que en la práctica carece de homogeneidad ideológica y que goza de escasas expectativas cara a ganar las elecciones, se agrupa en torno a la candidatura del general Paco Moncayo, un viejo militar de corte nacionalista que alcanzó notoriedad en 1995 como comandante en jefe de las Fuerzas Armadas del Ecuador en su conflicto militar con el Perú. Moncayo es precursor de lo que en el país se ha venido a llamar, en una alarde de imaginación inusitada, “militarismo ilustrado”.

A menos de dos semanas de los comicios electorales, las encuestas más serias en el país vienen a indicar que el partido de gobierno (Alianza PAIS) baja paulatinamente su intención de voto debido a los incesantes escándalos de corrupción institucional que están apareciendo casi de forma diaria en la prensa nacional. El diseño es estratégico y sin duda elaborado por la oposición conservada, quienes aguardaron hasta la campaña electoral para, con la complicidad de los medios de comunicación privados, posicionar una larga lista de depravados affaires gubernamentales que dan luz a la descomposición ética del régimen.

Esta campaña electoral se convirtió para Alianza PAIS en una especie de partido contra reloj, pues aunque se mantienen como opción preferencial del electorado ecuatoriano, su caída en intención de voto es sostenida y sus estrategas cuentan los días que faltan de campaña entre las angustias de la pudredumbre que se va aireando a su alrededor.

Para ganar en primera vuelta sin mayoría absoluta, Alianza PAIS necesita del 40% de los votos válidos con un 10% de ventaja sobre sus opositores. Dicha condición comienza a ponerse en cuestión, aunque el régimen cuenta con el apoyo de un Consejo Nacional Electoral (órgano rector de la democracia en el país, pero cuya composición en íntegramente oficialista) cuya imparcialidad electoral está en cuestión. En paralelo, el partido CREO liderado por Guillermo Lasso (principal fuerza opositora) apuesta por ser la opción elegida en el último día por parte de ese 30% del electorado que en pasadas elecciones depositó su voto por el correísmo, pero que en la actualidad se define como indeciso a pesar de lo avanzado de la campaña electoral y de que el voto en Ecuador sea obligatorio para el conjunto de ciudadanos comprendidos entre los 18 y los 65 años.

En todo caso y más allá de la opción política que triunfe electoralmente en esta campaña electoral, el próximo gobierno se verá obligado a proceder con un plan de ajuste que conllevará el recorte del gasto público y una renegociación para los pagos de la deuda externa contraída durante estos últimos años por el régimen. Además, basta oír los discursos de los principales presidenciables para entender que los planes diseñados para la salida de la actual crisis recaerá a todas luces sobre las espaldas de las y los trabajadores. Es de esperar que en base a lo anterior y con un gobierno que ya no gozará de la legitimidad social y política sobre la que se sustentó los primeros siete años de gobierno correísta, exista una recomposición del tejido social ecuatoriano. Será únicamente a través de la movilización social como se reempoderarán los movimientos sociales ecuatorianos, esos que protagonizaron en su momento las luchas de resistencia al neoliberalismo, permitiendo un acumulado histórico que llevo a Alianza PAIS al poder, y que hoy se sienten defraudados por el accionar de un gobierno que dijo representarles.

Decio Machado. Sociólogo. Consultor político residente en Ecuador.